terça-feira, 25 de março de 2008

CRÍTICA DA 'TRIBUNA DA IMPRENSA' NO RIO

Terror e lirismo no Poeira
"Salmo 91"
Lionel Fischer
Em uma de suas peças, Pirandello escolheu como título "Seis personagens à procura de um autor". Aqui, estamos diante de personagens reais, dez homens (interpretados por cinco atores) em busca de algo bem diverso: contar um pouco de suas amargas trajetórias e da desesperadora realidade que lhes coube viver.
Baseado no livro "Estação Carandiru", de Drauzio Varella, "Salmo 91" chega à cena (Teatro Poeira) com adaptação feita por Dib Carneiro Neto, direção de Gabriel Villela e elenco formado por Pascoal da Conceição (Dadá e Veio Valdo, o primeiro também cumprindo o papel de narrador), Pedro Moutinho (Charuto e Valente), Rodolfo Vaz (Bolacha e Veronique), Rodrigo Fregman (Zé da Casa Verde e Nego-Preto) e Ando Camargo (Zizi Marli e Edelso).
Como se trata de um livro por demais conhecido, e que já gerou um filme esplêndido, não cabe aqui resumir seu enredo. Até porque não temos propriamente um enredo, mas uma série de depoimentos daqueles que padeceram não apenas os horrores inerentes a uma penitenciária, mas que também foram vítimas do mais brutal e injustificável massacre já perpetrado contra detentos.
Para materializar na cena o ótimo texto de Drauzio Varella, convertido em irretocável texto teatral por Dib Carneiro Neto, o diretor Gabriel Villela optou por uma cena praticamente despojada de elementos, a não ser uns poucos, indispensáveis. E apostou tudo na capacidade do elenco de viver intensamente o horripilante contexto. E tal opção revelou-se inteiramente acertada.
Torna-se claro que estamos diante de cinco atores extremamente talentosos, de grande experiência e técnica impecável. Mas o fundamental é sua impressionante capacidade de entrega, a total disponibilidade para mergulhar em um universo sujeito a todas as atrocidades possíveis e imagináveis, tanto por parte dos responsáveis pelo presídio quanto dos próprios detentos.
Ainda assim, há pequenas brechas que permitem a materialização de momentos impregnados de poesia e lirismo, o que torna ainda mais sofrida a experiência do espectador, pois inevitavelmente ele é levado a crer que aquelas pessoas, ou ao menos uma parte delas, poderia ter tido um destino diferente, não fossem tão injustas as condições impostas por aqueles que detêm o poder.
Na equipe técnica, Villela assina cenografia e figurinos inteiramente em sintonia com sua proposta de direção, cabendo também destacar a expressiva iluminação de Domingos Quintiliano, a mesma expressividade presente na trilha sonora de Túnica.
SALMO 91 - Texto de Dib Carneiro Neto, baseado no livro "Estação Carandiru", de Drauzio Varella. Direção de Gabriel Villela. Com Pascoal da Conceição, Pedro Moutinho, Rodolfo Vaz, Rodrigo Fregnan e Ando Camargo. Teatro Poeira. Terça a quinta, 21h.

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